UMA VISÃO CRITICA RADICAL DE UM MUNDO RIDICULARMENTE IMORAL

SER COMPASSIVO É SUBVERTER-SE AO SISTEMA

terça-feira, 14 de julho de 2009

ESPIGAS E CASAIS

Eu viajava de volta da cidade de Montes Verdes, uma cidade turística muito bonita de Minas Gerais que preza pela preservação das suas tradições caboclas.

No acostamento da estrada estava um caboclo vendendo milho de sua roça. Parei e percebi que as espigas de milho estavam todas colocadas em baldes de plásticos, dispostas ao redor de dois grandes balaios.
- Boa tarde, Senhor, disse.
- Tarde - respondeu o caboclo
- Por quanto o senhor está vendendo o seu milho ? Perguntei, pegando uma espiga do balaio.
- É treis conto cada barde... - respondeu ele tomando a espiga de minha mão.
- Quantas espigas tem em cada balde?
- Eu ponho sempre treis casar. Às veis tem uns mais gordim outros mais magrim, mais sempre cabe todo mundo.
- E se eu quisesse comprar mais? O senhor não vende cada espiga à base de cinquenta centavos, aí eu vou levar umas vinte e cinco. É que eu quero levar para minha mãe para fazer umas pamonhas...
- Num vai dá não, sinhor. Num quero fazê nehuma desfeita pro senhor, mas essa estória de cinqüenta centavo tá me cheirando prejuízo. Tem munta gente esperta nestas estrada. Eu já passei por cada uma, o sinhor num sabe... E digo pro sinhor , é que eu trago de casa sempre os casar certim, se eu desfazê eles dispois eu num consigo mais vendê.
- O senhor não vai ter nenhum prejuízo não. - respondi achando estranho esta história de casal. Veja bem: se o preço do balde é três reais, no balde tem três casais , cada casal custa um real, logo, cada espiga custa cinqüenta centavos.
- Isso num dá certo não, sinhor. - insistiu o moço diesconfiado. - Esse negócio é muito compricado. Eu num colocá esse mundo de casar drento do barde. Isso eu num capais não, sinhor. Eu só sei vendê de barde memo.
- Mas você não precisa colocar no balde - eu falei, já quase perdendo a paciência. - A gente conta as espigas. Veja bem: se cada espiga custa cinqüenta centavos, são vinte e cinco espigas, logo, eu pago pro senhor doze reais e cinqüenta centavos.
- Num vai certo não, sinhô. - continuou o caboclo, já me fazendo pensar em desistir da compra. - Esse cinqüenta centavos que o sinhor fala me dexa disconfiado. Dispois, vai sobrá casar separado e num vai certo.Eu só sei vendê de barde memo. O sinhor vê aí com suas conta quantos barde o sinhor vai querê , eu encho os barde e o sinhor leva.
Eu já meio nervoso, peguei uma calculadora no carro, chamei o rapaz , fiz ele olhar para o visor da calculadora e calculei:
- Olha aí, 25 dividido por seis igual a quatro virgula desesseis. Está bem? Então eu vou querer quatro baldes e mais uma espiga. O senhor separa aí pra mim.
- Num vai não, sinhô. Eu já falei pro sinhor, uma espiga sozinha eu num posso vendê não sinhor. Eu só vendo de barde memo.
Já quase sem paciência, eu decidi:
- Está bem.. Então o senhor me encha cinco baldes.
O caboclo, na calma de sempre, pegou dois baldes e foi até dois balaios cheios de milho que estavam ao lado, pegando uma espiga de cada balaio, começou a encher cada balde.
Eu já tinha perdido muito tempo e estava tão ansioso que já não aguentava mais, fiquei indignado com aquilo, então perguntei:
- Eu não estou entendendo, porque o senhor está pegando cada espiga de um vasilhame?
- Ué, eu num falei pro sinhor que cada barde tem que ter treis casar? Então: desse lado, os espiga com cabelo cumprido, é as muié e, do outro lado, os careca, que é os home, juntando os dois, forma um casar...